Por Leonardo Roncetti (*)
As lingas, sejam elas de cabo de aço, cinta têxtil, corrente ou outro material, são elementos fundamentais para as operações de içamento, servindo como ligação entre a carga e o equipamento de guindar ou servindo como ligação com outras lingas ou acessórios.
A geometria, quase ilimitada, das cargas a serem içadas, traz desafios aos profissionais que escolhem, dimensionam e detalham as lingas. Portanto, ter ferramentas de cálculo eficazes que facilitem essas ações vai trazer segurança e eficácia operacional para os planos de movimentação de carga (planos de rigging).
Para o dimensionamento ou verificação das lingas, há alguns métodos consagrados, como o tabular, trigonométrico, do fator de uso, análise estrutural e outros, cada um com sua facilidade de implantação e resultados variando de otimizado a muito conservador.
A tabela seguinte resume três dos principais métodos, utilizados pelas normas brasileiras.
Como mostrado na tabela de métodos, o método do Fator de Uso reúne as vantagens do método tabular e do método trigonométrico, quando dispomos do valor da CMT para içamento vertical, que pode ser obtido de tabelas simplificadas, etiqueta ou plaqueta de identificação da linga.
O método do Fator de Uso tem como parâmetros o ângulo de inclinação das pernas da linga, a quantidade de pernas e a CMT da linga para a configuração de içamento vertical. Portanto, temos:
FU = N x Sen θ (Eq. 1)
CMTE = CMT x FU ou (Eq. 2)
CMTE = CMT x N x Sen θ (Eq. 3)
Sendo:
FU: Fator de uso.
CMTE: Carga máxima de trabalho efetiva da linga para a configuração proposta.
CMT: Carga máxima de trabalho da linga de 1 pernas para içamento vertical. Pode ser obtida da tabela de normas técnicas ou do catálogo do fabricante.
N: Número de pernas da linga, sendo 1 para linga de 1 pernas, 2 para linga de 2 pernas, 3 para linga de 3 ou 4 pernas.
θ: Ângulo da perna da linga com a horizontal.
Notas:
1) O ângulo θ é referido em relação à horizontal e não em relação à vertical. As normas técnicas adotam frequentemente a referência vertical.
2) A NBR 15637 a distinção entre CMT e CMTE. A CMT é a carga máxima de trabalho para linga de uma perna no içamento vertical, cujo valor é a referência para todos os demais cálculos. A CMTE é a carga máxima de trabalho para outras configurações aplicando o fator de uso sobre a CMT: forca, duas, três, quatro pernas, 2 pernas com forca etc.
3) A NBR 13541-1 e NBR 15516-1, que tratam, respectivamente de lingas de cabo de aço e lingas de corrente, não distinguem CMT de CMTE, adotado simplesmente CMT.
4) As normas brasileiras de lingas calculam suas tabelas com base no Fator de Uso.
Exemplos de aplicação
Exemplo 1: Qual a CMT de uma linga simétrica de cabo de aço com alma de fibra, diâmetro 19 mm, categoria de resistência 1770, com 2 pernas em ângulo com a horizontal de 60° (θ = 60°)?


Baseado no extrato da Tabela 3 da NBR 13541-1 (2017), primeiramente, vamos determinar como se obter o valor da CMT para 2 pernas com ângulo de 45°, cujo valor tabelado é de 5,3 t.
FU45°,2p = N x Sen θ = 2 * Sen 45° = 1,4
CMT45°,19mm = CMTVert,19mm x FU45°,2p = 3,8 x 1,4 = 5,3 t
Agora, calculamos a CMT para o ângulo de 60° com a horizontal:
FU60°,2p = N x Sen θ = 2 * Sen 60° = 1,73
CMT60°,19mm = CMTVert,19mm x FU60°,2p = 3,8 x 1,73 = 6,5 t
Portanto, se fossemos usar o método tabular, a CMT para 60° com a horizontal seria 5,3 t, pois, a tabela da norma não apresenta o valor para este ângulo. Utilizando o FU específico para 60° com a horizontal, otimizamos o valor da CMT para 6,5 t. Um ganho de 22%.
O valor da CMT de 6,5 t significa que podemos içar com a linga de 2 pernas com ângulo de 60° com a horizontal, uma massa que induza na linga uma força máxima de 6,5 tf, devendo fazer parte dessa força os efeitos dinâmicos e variações possíveis de peso.
Para dimensionar a manilha que conecta uma das pernas à carga, basta escolhê-la conforme a CMT da linga de 1 perna.
CMTmanilha ≥ CMTVert,19mm ≥ 3,8 t
Portanto, podemos escolher uma manilha com CTM de 4,75 t, pois a força máxima em uma perna não ultrapassará 3,8 tf.
Agora que temos o FU para ângulo de 60° com a vertical (FU = 1,73), podemos calcular qualquer CMT para os outros diâmetros:
CMT60°,16mm = CMTVert,16mm x FU60°,2p = 2,7 x 1,73 = 4,6 t
CMT60°,14mm = CMTVert,14mm x FU60°,2p = 2,1 x 1,73 = 3,6 t
CMT60°,13mm = CMTVert,13mm x FU60°,2p = 1,7 x 1,73 = 2,9 t

Exemplo 2: Agora, caso tenhamos uma linga de 4 pernas com as mesmas características, com θ = 60°, basta alterar o valor de N para 3.
FU60°,4p = N x Sen θ = 3 x Sen 60° = 2,59
CMT60°,19mm = CMTVert,19mm x FU60°,4p = 3,8 x 2,59 = 9,8 t
A manilha para esta configuração é a mesma da linga com 2 pernas, pois a força máxima continua sendo 3,8 tf em cada perna.
Para lingas de cintas têxteis, o procedimento é exatamente o mesmo.
Exemplo 3: Supondo o caso da Figura 4, utilizando cintas com CMT de 80 t (vertical), qual seria a CMTE da linga de 2 pernas em cada lado do balancim, para um ângulo de 60°?

Uma das vantagens das cintas é que não precisamos consultar a tabela para saber qual a CMT (vertical), bastando escolher aquela que desejamos utilizar.
Note que o Fator de Uso independe do tipo de material da linga, servindo para cabo de aço, cinta têxtil, corrente ou outro material.
Vamos calcular o CMTE dessa linga de 2 pernas para 45° e 60° com a horizontal.
CMTE45°,80t = CMTVert,80t x FU45°,2p = 80 x 1,4 = 112 t
CMTE60°,80t = CMTVert,80t x FU60°,2p = 80 x 1,73 = 138 t
CMTmanilha ≥ CMTVert,80t ≥ 80 t
Note que, para ambos os casos, a manilha permanece a mesma, pois a força máxima na perna é limitada ao valor da CMTVert,80t, isto é, nunca vamos utilizar uma perna mais carregada do que o limite da linga de 1 perna.
Se as 4 cintas fossem conectadas diretamente a um único gancho, teríamos a configuração de 4 pernas. Como no Exemplo 2 já calculamos o FU para 60° e 4 pernas, resta calcular a CMTE:
CMTE60°,80t = CMTVert,80t x FU60°,4p = 80 x 2,59 = 207 t
Caso desejemos utilizar essas lingas com ângulo de 45°, calculamos o novo Fator de Uso, a CMTE e a força na manilha:
FU45°,4p = N x Sen θ = 3 x Sen 45° = 2,12
CMTE45°,80t = CMTVert,80t x FU45°,4p = 80 x 2,12 = 169 t
CMTmanilha ≥ CMTVert,80t ≥ 80 t
Através dos exemplos, mostrou-se a facilidade do cálculo da CMT de lingas pelo método do Fator de Uso, que pode ser aplicado tanto no dimensionamento como na verificação de lingas de diversos materiais.
Como última recomendação, no cálculo da CMTE, a preferência é consultar os valores de CMTVert nas tabelas das normas técnicas.
(*)
Leonardo Roncetti, engenheiro, é doutorando em içamento offshore pela COPPE-UFRJ, mestre em estruturas offshore pela COPPE-UFRJ, e diretor da TechCon Engenharia e Consultoria. Contatos: leonardo@techcon.eng.br
Top Leonardo parabéns por você dar essa maravilhosa explicação tão importante para nós da movimentação de cargas pesadas