Por Wilson Bigarelli
A fé deu origem, no interior de São Paulo, a uma cidade e ao segundo maior templo católico do mundo, atrás somente da Basílica de São Pedro, no Vaticano. Construído aos poucos, ao longo das últimas décadas, o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida está novamente em obras – e desta vez por uma razão especial. Em 2017, comemora-se 300 anos do descobrimento da santa nas águas do Rio Paraíba do Sul. Prepara-se uma efeméride e tanto, que terá início já no próximo dia 12 de outubro (data oficial da santa que é considerada a padroeira do Brasil). Canteiros de obras e tapumes estão espalhados em vários cantos do santuário.
Em 2017, os 12 milhões de romeiros e visitantes que, em média, frequentam o local a cada ano encontrarão a cúpula interna finalmente revestida internamente, uma nova praça, em homenagem aos religiosos e devotos, e um monumento comemorativo aos 300 anos. Poderão também percorrer o Caminho do Rosário, a ligação física que faltava com o Rio Paraíba do Sul. E a glória: os sons eletrônicos que anunciam as horas do alto da torre darão lugar a um autêntico badalar de sinos no campanário, que também propagará cânticos e hinos tocados ao teclado.
Esse campanário, desenhado por Oscar Niemeyer, lembrando duas mãos juntas elevadas ao alto, foi erguido dia 4 de maio e está ganhando um acabamento de concreto, antes de receber os 13 sinos de bronze, recém-chegados da Holanda em dezembro do ano passado. Um para cada apóstolo e o último dedicado à Virgem Aparecida e a São José.
Voltando a 4 de maio, 9:30 da manhã. Dois guindastes Liebherr, da Guindastes Tatuapé, iniciam, com a devida benção do administrador-ecônomo do Santuário, padre Daniel Antonio da Silva, uma operação sincronizada, que havia sido definida em um ano de estudos pela IPS Engenharia, sob os olhos atentos da gestora Adriana Siane De Sêne, da Lotus, gerenciadora de obras no Santuário e Congregação, Edvaldo B. Peixoto e Wildes Larcher Neto (da IPS), Denys Garzon, diretor, e Jeferson Leonardo Pereira, encarregado de projetos da Guindastes Tatuapé, e um grande grupo de curiosos, incluindo, auxiliares, fornecedores e operadores de drones (haviam pelo menos três no ar filmando a operação). No comando dos guindastes, os operadores Edson (no LTM 1500-8.1) e Carlos Fidel, o Mineirinho, no LTM 1750-9.1.
A estrutura metálica do campanário tem 36 metros de altura e peso aproximado de 97 toneladas. Para erguê-la, inicialmente foi posicionada horizontalmente e um dos lados da base foi fixado por duas rótulas ou mancais de articulação para o içamento. Foram feitos dois outros pontos de ancoragem: um na ponta da estrutura, por onde esta foi erguida com o guindaste LTM 1500-8.1, e no outro lado da base, que foi sustentado pelo LTM 1750-9.1.
Quando a operação foi iniciada, o guindaste Liebherr de 500 toneladas, equipamento principal (configuração T6Y) lentamente foi verticalizando a estrutura metálica pela ponta. Ao atingir o raio de 39 metros, o peso da estrutura foi deslocado do LTM 1500-8.1 para o guindaste de 750 toneladas, guindaste secundário, cujas amarras estavam na base da composição. Duas horas depois (11:30 da manhã), tudo concluído. As mãos de Niemeyer estão levantadas para o céu. Iniciou-se imediatamente a preparação para a concretagem
Segundo Jeferson Leonardo Pereira, encarregado de projetos da Guindastes Tatuapé, o momento chave foi a transferência de carga do o guindaste principal (LTM 1500/8.1) para o secundário (LTM1750/9.1), embora ambos trabalhassem com muita folga em relação a suas capacidades. “No momento final do içamento, o guindaste secundário estava com 39 t (o outro, que iniciou com 28 t, zerou com 38 m de raio)”.
Jeferson Pereira diz também que a mobilização foi iniciada dois dias antes da operação, com o cuidado de encontrar o posicionamento adequado em um espaço bastante restrito de trabalho. A Guindastes Tatuapé, que mobilizou uma equipe de 10 pessoas, utilizou um terceiro equipamento, modelo LTM 1070-4.2, para a montagem dos outros dois. O LTM 1750-9.1 foi montado com 114 toneladas de contrapeso e sua lança telescópica completamente aberta, com 52 metros de comprimento. Já o LTM 1500-8.1 foi montado com 90 toneladas de contrapeso e 61,9 metros de comprimento de lança.
O badalar dos sinos
A estrutura do novo campanário é composta por uma base de 9 x 20 m e por dois fólios, o maior com 37,50 m e, o menor, com 32,50 m. É ela que sustentará verticalmente os 13 sinos. O primeiro deles, com peso de 2,5 t, ficará a 8 m da base. O último e menor, pesando 162 kg, ficará a 30 m da base. O conjunto será operado de duas formas: através de toques comuns ou de reproduções musicais personalizadas pelo Santuário, através de um teclado próprio para essa função. Para os toques tradicionais, os sinos serão movidos por motores eletromagnéticos.
Para a reprodução musical, permanecerão “parados” e martelos internos produzirão os sons do carrilhão. As notas musicais foram definidas em conjunto com os maestros do santuário e reproduzem a maioria das músicas dedicadas a Nossa Senhora Aparecida. A previsão é que os sinos estejam posicionados ainda em 2016.
Depoimento: Edvaldo Peixoto, diretor da IPS Engenharia:
A IPS Engenharia iniciou suas atividades efetivamente após a conclusão do projeto de arquitetura, com sugestões para a verticalização dos fólios. A princípio, a peça seria içada já concretada, com peso total de 265 toneladas, mas inúmeras análises realizadas sobre suas reações durante o içamento e as dificuldades para concretar a mesma na horizontal, levaram a Lotus a decidir que iriamos içar apenas a estrutura metálica e a concretagem seria realizada com os fólios já na vertical.
Após a definição de que a estrutura teria seu peso reduzido consideravelmente, a IPS Engenharia iniciou uma reavaliação das condições de içamento, desde os guindastes que seriam utilizados e a possível otimização dos recursos necessários para o içamento, visto que o peso teórico da estrutura passou a ser de 105 toneladas.
O primeiro grande desafio para IPS Engenharia em todos os projetos é otimizar recursos garantindo a segurança das operações desde a logística de acesso dos equipamentos envolvidos até a realização do içamento.
Nesse projeto, após a redução do peso da estrutura, sugerimos algumas possibilidades para a verticalização dos fólios. Uma delas, a criação de dois mancais na base inferior da estrutura. O projetista da mesma analisou a possibilidade e sinalizou positivamente para a opção apresentada. Com isso, criamos uma condição atípica para uma operação de verticalização, que seria um terceiro ponto de carga, ou seja, os dois guindastes somados ao apoio no solo sobre os mancais – o que possibilitaria uma redução de recursos, porém exigiria muito mais dos envolvidos, tanto na elaboração do planejamento de Rigging, quanto na execução do içamento.
O ponto critico dessa operação seria a transferência de carga do guindaste principal para o auxiliar, em razão da carga estar sempre apoiada nos mancais e o seu CG (centro de gravidade) teórico bem próximo da base. Desenvolvemos um gráfico de carga para identificarmos em que momento deveríamos iniciar a transferência de cargas, sem que o peso total fosse colocado sobre os mancais, o que poderia causar um grande problema para os guindastes. O gráfico contemplava ângulos e raios de operações para os dois guindastes permitindo o planejamento perfeito e seguro da operação.
Para o dimensionamento dos guindastes, o desafio foram as interferências no solo, muitas galerias, passagens de tubulações, cabos de fibra ótica e energia. Estávamos sempre limitados pela impossibilidade de remoções dessas interferências. Mas, com muitas horas de estudos em parceria com os engenheiros da Lotus Engenharia, conseguimos posicionar os guindastes de forma que não precisaríamos alterar ou remover as condições existentes do solo.
Com a conclusão dos estudos preliminares a Lotus Engenharia convidou as principais empresas guindastes do Brasil e a IPS Engenharia auxiliou na equalização das propostas técnicas, permitindo assim que as empresas concorressem em igualdade comercial. Após a definição da vencedora, iniciamos a elaboração dos estudos de Rigging executivos utilizando os modelos de guindastes contratados, no caso da Guindastes Tatuapé, um Liebherr LTM 1750 e um Liebherr LTM 1500.
A IPS Engenharia solicitou à Tatuapé Guindastes que informasse exatamente as dimensões dos Mats dos equipamentos para que pudéssemos realizar a revisão nos cálculos de pressão no solo e verificarmos também os impactos dos mesmos nas interferências do solo. Após o recebimento das informações, viabilizamos as posições sem maiores problemas, ficando apenas pendente uma adequação na capacidade do solo.
A Lotus Engenharia então preparou bases de concreto, cada uma com sua particularidade e de acordo com a pressão calculada que seria exercida no solo pelos Mats, garantindo assim um dos principais pontos para uma operação dessa magnitude ser realizada com segurança.
Para execução da operação a IPS Engenharia mobilizou o engenheiro Wildes Larcher Neto dois dias antes do içamento para acompanhar e fiscalizar o acesso, posicionamento e montagem dos guindastes nas posições de acordo com as bases de concreto construídas para distribuição de cargas, o posicionamento dos guindastes foram aferidos com uma equipe de topografia garantindo a posição de acordo com o planejamento de Rigging.
A próxima missão no grande projeto do campanário serão os içamentos e a montagem dos treze sinos.