Uma Comissão de Estudos (CE-099.010.001), no âmbito da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), com participação de vários profissionais da área de içamento de cargas, debate atualmente a regulamentação dos Planos de Rigging. Com o objetivo de contribuir com esse trabalho, ouvimos alguns desse profissionais e outros especialistas, com interesse direto nessa discussão, sem dúvida importante, mas que envolve algumas questões polêmicas e controversas.
O primeiro ponto a considerar parece óbvio, mas não pode deixar de ser considerado: qual a necessidade de uma norma para regulamentação de planos de rigging? Ou, colocado em outros termos: essa atividade prescinde ainda de padrões, que não estão determinados em outras normas?
“Sem dúvida que a regulamentação é necessária, pois as normas brasileiras atuais não estabelecem sistematicamente os padrões para o plano de rigging, necessitando-se de uma norma específica”, responde Leonardo Roncetti, diretor da Techcon Engenharia. “Com toda certeza, confirma Edvaldo Peixoto, diretor da IPS Engenharia, “visto que hoje temos diversas normas de referências, mas nenhuma específica para a elaboração de projetos de movimentação de cargas, que entendemos ser essencial, em razão dos riscos envolvidos em operações de içamentos”.
Para ele, o desenvolvimento e implantação de uma norma técnica para projetos de movimentação de cargas será extremamente importante para estabelecer regras, diretrizes e características para o profissional responsável pela elaboração dos projetos de movimentação de cargas (planos de rigging). “O principal objetivo da norma será padronizar as informações mínimas necessárias para garantir a segurança e eficiência nos içamentos”. Leonardo Roncetti complementa: “No Brasil, atualmente, há grande variedade na qualidade e quantidade de informações trazidas pelos planos de rigging. Em muitos casos, insuficiente para garantir segurança mínima no içamento, sendo necessário o estabelecimento claro das informações que devem constar nos planos em função do tipo de içamento”.
Leonardo Scalabrini, outro especialista da área, considera, inclusive, a regulamentação urgente. “Atualmente cada empresa adota seu próprio padrão, baseando-se em poucos critérios existentes nas NRs. E apesar de alguns padrões serem similares, a falta da norma resulta em uma insegurança técnica e até mesmo de fiscalização entre um local e outro). Marcos Haibara, diretor da HACC Engenharia, concorda: “O fato é que a qualificação e os conhecimentos técnicos de muitos profissionais diretamente envolvidos deixa a desejar e isso se reflete nos içamentos. É necessário estabelecer um padrão mínimo e subir a régua”.
“Atualmente”, acrescenta Gustavo Cassiolato, diretor da Rigging Brasil, “as normas nacionais abordam a movimentação de cargas de forma pontual e dispersa, como a NR-18, que exige planos de carga para canteiros de obras. Essa falta de uniformidade acaba resultando em planos inconsistentes e inseguros, dependendo muito do entendimento individual de cada profissional”. Jeferson Pereira, diretor da Alllift, aponta o mesmo problema, ou seja, em geral, os planos de rigging são baseados na experiência e expertise de cada profissional que elabora o planejamento.
“Essa situação é intensificada pela falta de entendimento sobre os itens indispensáveis em um plano de rigging e pelas frequentes dúvidas no mercado quanto à obrigatoriedade de sua elaboração. A norma resolverá essas questões e contribuirá para a realização de auditorias mais precisas e confiáveis”. Cristiano Capassi, da Ciale, resume: “a atividade de rigging requer conhecimentos técnicos especializados, e a normatização irá contribuir para um ambiente onde os profissionais possam seguir os mesmos protocolos amparados por diretrizes claras”.
A Comissão de Estudo CE-099.010.001, com base nas sugestões recebidas, está procurando definir um Plano Básico (um formulário) e um plano detalhado (o Plano de Rigging efetivamente). A segunda pergunta então é exatamente essa: que tipo de operações (carga a ser içada, local de trabalho, altura de içamento) exigiriam somente um plano básico e quais outras não poderiam prescindir de estudos de rigging mais completos?
“Para todas as operações deve-se elaborar o Plano Básico. Para aquelas operações mais críticas, um Plano de Rigging mais completo deve ser adicionado ao processo de planejamento e execução do içamento”, diz Leonardo Scalabrini. Ele explica que a definição do içamento crítico ainda está sendo cuidadosamente discutida na Comissão de Estudo CE-099.010.001 para que realmente a norma não se torne um fator complicador. “Todavia, com certeza, serão considerados fatores como a característica da carga (peso, dimensões, geometrias), pontos de içamento, amarração da carga, local de patolamento do guindaste, solo/terreno, interferências no local do içamento, número de equipamentos envolvidos.
“Pode-se gerar planos de rigging simples quando houver estudos complementares que tratem de questões como tensão admissível do solo, projeto estrutural de balancins e olhais, dimensionamento prévio das lingas etc”, sugere Leonardo Roncetti. Marcos Haibara lembra que são vários os requisitos que devem ser avaliados para chegar a uma definição se a operação poderá se utilizar de um plano básico ou se há necessidade de um plano mais detalhado. “Em muitos casos, uma operação que parecia ser simples muitas vezes é um grande desafio, o que exigira algumas medidas preventivas de segurança advindas de estudos mais apurados).
O importante, segundo Gustavo Cassiolato, é tornar a norma prática e aplicável, diferenciando claramente as operações simples das complexas. “Nem toda movimentação de carga justifica um plano de rigging completo, pois isso inviabilizaria operações rotineiras e de baixo risco, tornando o processo burocrático e custoso”. Para fundamentar a análise de riscos, ele propõe a utilização como referência das normas ISO 31000 e ISO 31010, que orientam práticas de gestão de riscos, complementadas por alguns critérios para avaliação dos riscos operacionais envolvidos.
Tais como: riscos potenciais para pessoas, riscos na proximidade da área de trabalho, complexidade da atividade de manuseio de carga, impacto adverso das condições ambientais, capacidade e/ou desempenho do equipamento de movimentação de carga, e/ou desempenho de amarração, impacto comercial adverso, requisitos do local exclusivos para a atividade de manuseio de carga elevações repetitivas. “Dessa forma, o profissional irá avaliar a criticidade da operação e determinar qual caminho deverá ser o planejamento a ser realizado – plano básico ou plano de rigging completo, onde iremos denominar de plano de movimentação detalhado”.
Se, com a norma, será possível, com base em critérios técnico-operacionais decidir se será um plano básico (um formulário ou algo do tipo) ou um Plano de Rigging, poderia se perguntar qual profissional estará habilitado a tomar essa decisão?
Para muitos dos envolvidos no debate isso parece claro. “Pelo responsável técnico pela operação juntamente com sua equipe de segurança”, diz Edvaldo Peixoto. “Pelo engenheiro projetista do içamento, baseado nos critérios da norma de Plano de Rigging”, diz Leonardo Roncetti.
Jeferson Pereira entende que essa decisão caberá à engenharia da empresa e à equipe de movimentação de cargas. De qualquer modo, como lembra Gustavo Cassiolato, uma discussão que ainda está em debate na Comissão de Estudos, em suas reuniões mensais, é a definição do que deve constar em cada plano, para garantir que atenda às necessidades operacionais e promova a máxima segurança. “Todas as premissas para cada tipo de atividade devem estar claramente estabelecidas, considerando também, a sua categorização que deve estar incluída em seu nível de criticidade”, diz Cristiano Capassi
Na opinião de Leonardo Scalabrini, ambos os tipos de planos de rigging devem conter ao menos as informações básicas: configuração do guindaste, forma de amarração e materiais de içamento empregados, materiais de patolamento utilizados, indicação de interferências no local e descrição da dinâmica/movimentações do içamento. “Já o Plano de Rigging mais completo deverá detalhar melhor, por desenhos, memórias de cálculo e laudos adicionar estes itens, de forma a certificar que as criticidades do içamento em questão não representem um fator de insucesso e insegurança para a operação vindoura”.
Um velho dilema na área de movimentação de cargas também está em debate: quem está qualificado para elaborar e assinar um plano de rigging?
Nesse ponto, as opiniões se dividem. “A definição de atribuição (não competência) é de caráter legal, portanto, estabelecida por lei. Na minha opinião, tem atribuição legal para elaboração dos planos de rigging profissionais da engenharia civil, mecânica, naval, segurança do trabalho, aeronáutica e aquelas equivalentes”, diz Leonardo Roncetti.
“Esta competência pode e deve ser estabelecida por uma regulamentação específica. Até mesmo porque, dentro dos próprios conselhos de classe não há uma concordância de qual é o eixo/grupo de formação responsável pela elaboração e aprovação do Plano de Rigging”, diz Leonardo Scalabrini.
Edvaldo Peixoto lembra que para que um estudo, planejamento ou especificação tenha caráter legal, é necessária a abertura de uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) junto ao Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA). E como a atividade está relacionada a equipamento mecânico (guindaste) cabe ao engenheiro mecânico ou de produção/industrial oriundo da mecânica essa ART, ficando aos profissionais de outras modalidades da engenharia a solicitação de uma análise do CREA para acréscimo desta atribuição embasado em sua grade curricular.
Por outro lado, no que diz respeito à elaboração, a Norma Regulamentadora NR 12 possui no seu anexo XII a seguinte definição: Profissional de movimentação de carga (Rigger): responsável pelo planejamento e elaboração do plano de movimentação de cargas, capacitado conforme previsto no item (12.16.3). “Para os planos de rigging, os elaboradores geralmente são engenheiros ou técnicos capacitados por centros de treinamentos especializados no assunto”.
“O Plano de Rigging nada mais é do que um Projeto de Movimentação de Carga. O profissional que elabora este projeto deve ter as qualificações exigidas pelo conselho de classe correspondente. Criar uma regulamentação específica definitivamente não é um caminho seguro”, entende Marcos Haibara. Cristiano Capassi ressalta que a análise e planejamento para uma movimentação de cargas, pode exigir verificações de diversas competências. “O profissional deve possuir a capacidade analisar e compilar informações de outras especialidades, como forma de subsidiar um projeto que seja mais amplo, mas que também, possibilite sua responsabilização técnica pelos protocolos e documentos elaborados dentro do seu campo de atuação”.
“A elaboração e assinatura de planos de rigging devem ser atribuições exclusivas do profissional legalmente habilitado (PLH), conforme estabelecido pelos conselhos de classe (CREA/CONFEA)”, diz Gustavo Cassiolato Essa abordagem, segundo ele, garante que o plano seja feito por alguém com formação técnica adequada e conhecimento das normas aplicáveis. “A definição clara dos profissionais que atuam com movimentação de carga foi estabelecida na ABNT NBR 17089, uma norma técnica desenvolvida pela nossa comissão, que determina as atribuições específicas de cada função envolvida nesse processo. Nesse contexto, o Projetista de Movimentação de Carga (Rigger), é profissional capacitado para o planejamento de movimentação de carga e devidamente habilitado, com registro no conselho de classe competente”.
Para Jeferson Pereira, as normas vigentes não especificam a formação mínima necessária nem qual órgão de classe é responsável por essa atribuição. Por conta da obrigatoriedade da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), essa responsabilidade está vinculada ao CREA, que atribui a disciplina de engenharia mecânica como responsável pela elaboração do plano de rigging, sem citar outras disciplinas. Isso, entretanto, não impede que profissionais de outras áreas elaborem planos de rigging, já que não há menção restritiva explícita em documentos do CREA. “Atualmente, técnicos mecânicos e de outras áreas vêm elaborando planos de rigging e emitindo Atestados de Responsabilidade. Surge, portanto, a necessidade de um posicionamento mais claro sobre essa atribuição”.