Por Miriam Carvalho (*)
A Carvalhão é um negócio familiar desde 1960, um legado criado por meu pai, Silvio Carvalho, que optou por trocar o trabalho em escritório por uma atividade bem operacional – e logo estava dirigindo um pequeno caminhão. Ele queria que eu fizesse engenharia civil, mas optei por arquitetura e o acompanhava sempre nas obras, incluindo a da então nova sede da empresa, mesmo ainda não formada. Isto me deu muita base para gestão de projetos, processos, formação em cálculo e estruturas e, especialmente, visão espacial, ou seja, este conhecimento prévio me ajudou bastante mais adiante, nas operações de movimentação e com guindastes.
Cheguei a ter escritório próprio e aprendi como é difícil empreender e a lidar com clientes, fornecedores e com toda a gestão. Com o falecimento dele em 1994, comecei a trabalhar efetivamente na área de logística, até porque estava fechado um grande contrato na parte de armazenagem, que precisava de alguém dedicado, pois era um projeto logístico bem diferenciado à época. Depois, me envolvi com terceirização de movimentação com empilhadeiras. Me apaixonei, me empenhei em adquirir e complementar conhecimento especifico e não parei….
Percebi que seria importante a contribuição nos negócios da família, e pude fazê-lo de imediato, participando de uma série de operações dedicadas surgidas naquele período. A vantagem é que já cheguei com tarimba para atendimento aos clientes e sabendo como lidar com uma mão de obra de operadores, motoristas e ajudantes, organizados de modo assemelhado ao da construção civil.
No início, fui apoiada por homens, fui discriminada por homens e, lamentavelmente, também por mulheres, muitas vezes e infelizmente mais machistas. Houve questionamentos também por conta da idade, pois eu era muito nova, mas sempre tentei contornar com postura profissional, seriedade, dedicação e com estudo. Vim de uma família que valoriza o trabalho e o estudo – artigo de luxo, que meus pais e avós não tiveram acesso. Algumas vezes vi clientes surpresos pelo fato da reunião ser conduzida por uma mulher (ou algumas), mas tive a alegria de termos respeito, alguns pequenos e pontuais reconhecimentos e expressões de admiração.
Vim da construção civil, num meio muito parecido, em que até hoje as mulheres são, lamentavelmente, discriminadas, e onde tentam diminuir seus trabalhos e conquistas, seus rendimentos, enfim, ainda há árduas batalhas, mas a sociedade está mudando. Acredito num despertar, com mais acolhimento e endosso às mulheres, sendo que ainda é muito difícil, em qualquer lugar do mundo…
O fato de eu ter formação em uma área técnica, com conhecimentos na parte de estrutura cálculo estrutural, mas também espacial, e ser criativa com certeza também me ajudou bastante. Bem como aprender com quem faz, ter escuta ativa com uma equipe que conhece muito, com prática em situações complexas. Me entendo muito bem com nossos supervisores, operadores e motoristas. Aprendi muito com nossa equipe!!!!
Eu acredito que, em geral, as mulheres são mais flexíveis e estão mais dispostas a uma convergência de opinião. E entendo que elas também são mais detalhistas e cuidadosas. Elas têm focado em maior estudo, então cada vez mais estão ingressando engenheiras, técnicas de segurança e em logística nesse segmento.
A empresa Carvalhão, e isto não é de agora, é uma empresa que sempre foi inclusiva e começou a dar oportunidade para as mulheres na época do meu pai, entre as décadas de 70 e 90. Aqui, credo, cor e gênero nunca foram impeditivos para as pessoas serem acolhidas respeitadas e terem suas possibilidades de crescimento exploradas.
Além disso, hoje a empresa tem duas mulheres à frente. Eu cuido da parte comercial e operacional e minha irmã, Daisy Carvalho, com 30 anos de casa, responde pela direção administrativa e de recursos humanos da empresa. A Carvalhão sempre teve mão de obra feminina e chegamos a ser pioneiros em contar com um departamento comercial feminino.
Para outras mulheres que querem seguir a trajetória no setor de movimentação de cargas é importante que não desistam. Se posicionem, não permitam que outros (inclusive outras mulheres) tentem diminuir suas colaborações ou conquistas. Porque o conhecimento, a postura profissional e a dedicação vencem todas essas barreiras.
Que as novas gerações possam percorrer uma trilha mais suave e definida. Já tivemos uma operadora de empilhadeira e de guindaste aqui, extremamente elogiadas e destacadas em operações. Intervi quando eu senti que havia algum tipo de situação interna (raro aqui) não adequada.
Desafios e conquistas não estão atrelados a questões de gênero, condição social ou de educação formal. Acredito na força de vontade e no trabalho acima de tudo, pois o segmento requer carga horária grande, já que o que fazemos muitas vezes não tem hora. A carreira em logística e guindastes exige muitas renúncias, pois o telefone toca, no final de semana, na madrugada, na festa da escola. Tem que ter amor ao trabalho e escolher de modo consciente.
(*) Miriam Carvalho é diretora da Carvalhão Guindastes e Transportes